O presente "Blog" constitui um repositório de artigos que foram enviados para publicação ou publicados na revista da ordem dos médicos.
A sua compilação é aqui disponibilizada para que, além dos leitores da revista da ordem dos médicos, outros também possam refletir sobre um extenso rol de inquietações que este moderno mundo em convulsão nos acomete...!
Por força da nossa natureza humana, que não prima pela bondade, o interesse prevalece quase sempre sobre os afectos e não raramente sobre os princípios, e por isso, se queremos ter um SNS (que já foi dos melhores) que a todos sirva bem, arredemos os pressupostos madrigalescos e utópicos, de que os médicos são seres morais de topo, impolutos como a Santa Madre Teresa de Calcutá e de tal grandeza de caracter, que barricados no seu ideal de servir e de tratar, resistirão estoicos, às lamúrias rancorosas dos filhos, descoroçoados, por o “papá” ser um pelintra.
Tais presunções só iludem os simples e beneficiam os que, sem um mínimo de honra ou de decência, pretendem alambazar-se nos despojos de um SNS destroçado, deixando os cidadãos de recursos parcos, encurralados pela doença e pela morte escusada, à míngua de quem os trate.
Os santos, quer na classe médica, quer na eclesiástica, são notoriamente escassos, e, se abundam os que jazem sob o lajedo dos templos ou esculpidos em pedra e em talha, suscitam-nos uma dúvida razoável quanto à sua santidade e quanto à sua proveniência de classe.
Para que o SNS volte a erguer-se, das ruínas esbarrondadas do que já foi, e a orgulhar-nos, urge entupir e vedar todos os vasos comunicantes entre o privado e o público e canalizar para este, todos os recursos (que afinal jorram dos bolsos dos contribuintes num manancial crescente de esbulho) sendo de inteira justiça que sejam estes a beneficiar.
As clínicas e os hospitais privados, que se amanhem com as seguradoras, com as Misericórdias, com essa sanguessuga voraz em que se metamorfoseou a ADSE valendo-se da fragilidade e do medo dos velhos e da complacência cúmplice, do nosso Estado dito de direito, e enfim, com todos os” negociozinhos da doença” e os da morte, num futuro próximo. Os doentes que presumindo-o, e mal, que serão melhor tratados nas clínicas privadas, que as paguem ou que façam um seguro de saúde, que lhes comparticipe as bagatelas e que os descarte, quando a doença ou o conhecimento antecipado desta, pela devassa dos arquivos clínicos e não só, os alerte (aos seguros) para um prejuízo eminente…
Reerguer e dignificar as carreiras médicas, tornar meritório transpor-se o crivo de malhas estreitas que conduz aos internatos de especialidade nos hospitais públicos, contratar os médicos por concursos públicos dignos, diferentes das degenerescências, que se tornaram hábito desde a ultima década do século passado, desmoralizando e desmotivando muitos colegas entre os melhores, e, pagar bem aos que ingressarem nos quadros mas impondo-lhes a exclusividade, obstando assim, à mobilidade e à volubilidade dos interesses. O resto virá espontaneamente em pouco tempo e as clínicas privadas (excepto as de grande valia) depressa voltarão à insignificância, que as caracterizou durante o apogeu efémero do SNS.
Se de facto o país está sem cheta, apesar das mordomias gritantes, é preciso poupar no supérfluo e não naquilo que é primordial para a maioria dos cidadãos, como um SNS a que todos possamos recorrer, com a certeza de ser bem tratados. É preciso por no seu lugar estes políticos profissionais que eleitos pelos partidos e pelo voto da maioria governam despudoradamente para servir os do costume, e se necessário for, amedronta-los, e a primeira despesa a abolir, é limitar o número de deputados, vereadores, etc., que alguns sem tugir nem mugir ou apresentar trabalho relevante em muitos anos, proliferam numa abundância de praga.
E acabar de vez com esses sorvedouros de euros que são as parcerias público-privadas.